Política e politicalha
A política afina o espírito humano, educa os povos,
desenvolve nos indivíduos a atividade, a coragem, a nobreza, a previsão, a
energia, cria, apura, eleva o merecimento.
Não é esse jogo da intriga, da inveja e da incapacidade,
entre nós se deu a alcunha de politicagem. Esta palavra não traduz ainda todo o
desprezo do objeto significado. Não há dúvida de que rima bem com criadagem e
parolagem, afilhadagem e ladroagem. Mas não tem o mesmo vigor de expressão que
os seus consoantes. Quem lhe dará o batismo adequado? Politiquice?
Politiquismo? Politicaria? Politicalha? Neste último, sim, o sufixo pejorativo
queima como ferrete, e desperta ao ouvido uma consonância elucidativa.
Política e politicalha não se confundem, não se parecem, não
se relacionam uma com a outra. Antes se negam, se excluem, se repulsam
mutuamente.A política é a arte de gerir o Estado, segundo princípios definidos,
regras morais, leis escritas, ou tradições respeitáveis.
A politicalha é a indústria de explorar o benefício de
interesses pessoais. Constitui a política uma função, ou um conjunto de funções
do organismo nacional: é o exercício normal das forças de uma nação consciente
e senhora de si. A politicalha, pelo contrário, é o envenenamento crônico dos
povos negligentes e viciosos pela contaminação de parasitas inexoráveis. A
política é a higiene dos países moralmente sadios. A politicalha, a malária dos
povos de moralidade estragada.
Rui Barbosa.
Trechos escolhidos de Rui Barbosa.Edições de Ouro: Rio de
Janeiro, 1964.
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